Muito tem se especulado nos últimos dias sobre o aumento de casos de violência doméstica no período de quarentena em razão da pandemia do coronavírus. Bem verdade que a OMS – Organização Mundial da Saúde classificou a questão sobre violência doméstica como prioridade nestes tempos, solicitando que as nações do mundo inteiro tomassem medidas para o enfrentamento deste problema.
Recentemente o escritório RGL Advogados realizou uma webinar sobre o assunto com profissionais especialistas em Direito Criminal e Relações de Conflito para tratar sobre este tema, trazendo os principais aspectos que relacionam a violência doméstica, suas modalidades e principalmente medidas de enfrentamento.
Entretanto, um questionamento que devemos fazer atualmente no Brasil é, a violência doméstica somente aumentou por decorrência da pandemia do coronavírus?
Esta é uma questão extremamente complexa, pois, por mais que os números demonstrem que uma parcela de casos relacionados a violência doméstica tenha sido acentuada neste período de pandemia, este é um problema que sempre existiu e sempre houve superlotação de casos relacionados a este fim.
O Brasil nas últimas décadas tem batido recordes de casos de violência e talvez neste período recente os casos que conhecemos tiveram uma repercussão maior, ou seja, se deu publicidade ao problema que já existia e já afetava milhares de mulheres, crianças e idosos em todo país.
A triste realidade brasileira é que talvez a violência doméstica ganhou uma atenção maior pelo fato desta violência ter chegado a pessoas de grande influência, com a possibilidade de tornar esta discussão de forma mais ampla e pública, o que não quer dizer que a violência antes da crise era potencialmente menor.
É obvio que temos que reconhecer que as medidas de isolamento social podem sim ter influência para que casos de agressão física e verbal se intensifiquem, mais isso necessariamente não quer dizer que estas agressões se iniciaram dentro da pandemia.
A Lei Maria da Penha, que é uma das legislações que atende casos de violência doméstica, trazendo em seu conteúdo diversos apontamentos que visam proteger o bem jurídico tutelado nas relações domésticas, não se limitando somente na agressão física propriamente dita.
Um exemplo que podemos mencionar neste artigo é a violência psicológica, ou seja, aquela que não ocorre uma ou duas vezes, nem durante um ou dois meses, mas de forma constante, chegando ao ponto de tornar a relação de convivência uma relação escrava e humilhante.
Neste caso o agressor passa ser um carrasco do lar e impulsiona de forma verbal uma humilhação diária contra a vítima, que infelizmente, na maioria das vezes são mulheres.
A escravidão psicológica é uma forma de agressão tão terrível quando a agressão física, pois tem um caráter de continuidade, ou seja, não cessa quanto os insultos param, mas tem o condão de atormentar a vítima que se sentirá menosprezada constantemente, com sentimento de impotência diante daquela situação.
Este exemplo utilizamos para ilustrar o fato de que o período da pandemia e isolamento social não seria capaz, “somente” de contribuir com o aumento da violência doméstica, pois esta já existia antes do isolamento, o que reforçamos aqui é que esta violação teria talvez se intensificado nestes dias de confinamento, o que faz toda a diferença quando analisamos os números e estudamos as formas de se combater este grande mal.
Por fim, além de trazer a reflexão proposta, reforçamos aqui a necessidade de se realizar a denúncia e comunicação de situações de violência doméstica as autoridades competentes. O Estado de São Paulo inaugurou recentemente a possibilidade de se comunicar crimes desta natureza através do Boletim de Ocorrência Online, que é um grande avanço para esta causa. Empresas privadas também estão engajadas para auxiliar as vítimas a fazer a comunicação, por exemplo a empresa Magazine Luiza, que através de seu aplicativo para celular, criou um canal de denuncia para que mulheres em situação de risco possam denunciar seus agressores sem que estes a descubram e a impeçam.
A violência doméstica é um problema seu também, informe-se, denuncie, pois só assim, viveremos sem ela.